Elogiar parece positivo pois dá a impressão de que fomentamos auto estima e confiança.

A longo prazo o que acontece é que criamos na criança a necessidade de aprovação externa, da qual vai depender para o resto da sua vida, e hoje em dia vemos adultos, que necessitam permanentemente daquela “palmadinha nas costas” para sentir que o que fazem está bem. O que acontece é que eliminamos a sua capacidade de se automotivar, a motivação interna.

Como vai sentir-se satisfeito com o seu trabalho, se não é capaz de o valorizar por si próprio?

Em Montessori não elogiamos a criança quando faz um bom trabalho, da mesma forma que não se corrige quando faz mal. Para se autocorrigir, a maior parte do material e atividades Montessori possui em si um “controlo do erro”, que ajudam a criança a ter perceção de como está o resultado do seu trabalho, pelo que a criança não espera a nossa aprovação, ele próprio pode perceber se está bem ou o que deve corrigir.

A grande questão está em que os elogios criam dependência, tanto em adultos como crianças. Como educadores, sentimo-nos bem quando elogiamos as crianças, pois expressamos o quão orgulhosos estamos deles, e estes por sua vez sentem-se bem pois têm a nossa aprovação. Mas o elogio constante faz com que a criança deixe de fazer um trabalho pelo prazer e satisfação que esta atividade lhe proporciona, mas pela agradável sensação de ser elogiado, e no fim o elogio é tão importante como o trabalho e o esforço passa para segundo plano….

Para ilustrar o que vos conto, dou-vos o exemplo de um estudo* feito nos EUA com mais de 400 crianças de 5º ano, em que as desafiavam a fazer um quebra-cabeças relativamente fácil. Quando acabavam, alguns eram elogiados pela sua inteligência (“foste bem esperto, hã!) e outros, pelo seu esforço (“empenhaste-te mesmo a sério, isso é que foi um enorme esforço, hã?!”). Numa segunda rodada, mais difícil, os alunos podiam escolher entre um novo desafio semelhante ou diferente, um pouco mais complexo. O que aconteceu foi que a maioria dos que foram elogiados como “inteligentes” escolheu o desafio semelhante e a maioria dos que foram elogiados como “esforçados” escolheu o desafio diferente. Uma escolha, influenciada por apenas UMA frase.

Os que escolheram um desafio semelhante tinham receio de falhar e com isso deixar de ser considerados inteligentes, algo que eles não controlam. Por outro lado os segundos, cujo esforço foi reconhecido, sendo algo que controlam e depende destes, aceitaram um desafio maior percebendo que não seriam julgados nem abalaria a sua autoestima, mas seria uma oportunidade para aprender e crescer.

 

Mas então, perguntam vocês, como reagimos quando uma criança nos mostra, feliz da vida, um trabalho bem feito?

Ora a nossa reação não tem necessariamente de ser bater palmas e gritar hurra, ou dizer muito bem, ou que esperto és, à mínima coisa que a criança faça! Claramente também não é preciso fazer cara de enterro, temos alternativas que ajudam a que a criança reflita sobre o que fez, valorizando o seu trabalho e esforço.

Quando começamos a pensar em como reagimos perante uma conquista ou algo que a criança nos mostra, deparamo-nos muitas vezes com o elogio vazio, e chamo vazio pois não acrescenta nada mais que dependência, e ao tornarmo-nos conscientes perguntamo-nos, o que poso fazer como alternativa, que ajude esta criança a ser mais segura de si, confiante e menos dependente de mim, adulto?

Há duas dicas que são uma grande ajuda, claro que a nossa expressão corporal, o nosso sorriso e disponibilidade são chave:

– Coloco uma questão acerca do que me estão a mostrar,

– Descrevo aquilo que vejo.

Por exemplo, a criança acaba de fazer um desenho com vários rabiscos e cores e podemos dizer:

“Fizeste um desenho muito colorido (descrição), conta-me o que aí está!!”

Mostramos interesse pelo que a criança faz, mostramo-nos disponíveis em saber mais, estimulamos a reflexão sobre o que fez, a escolha de cores, o espaço usado na folha, e estas serão as questões que a criança se irá colocar na próxima vez que fizer um desenho ou um outro trabalho.

Ou quando a criança passa imenso tempo a fazer uma construção, onde o equilíbrio entre as peças foi algo difícil de conseguir e de repente, finda esta árdua tarefa olha para nós com aquele sorriso e sentimento de missão cumprida, o que podemos fazer?

“Esforçaste-te imenso para fazer esta construção, pois foi? Estás orgulhoso do teu trabalho? Mostras-me como conseguiste?”

“Vejo que estás muito feliz por ter conseguido fazer esta construção! Esforçaste-te imenso e conseguiste!”

Nestas situações reconhecemos o trabalho e o esforço, que são aspetos que a criança controla, incentivando à reflexão do trabalho, mostrando opções para resolução de problemas, colocando a tónica na criança, apelando à sua motivação interna.

Claro que vamos dizer inúmeras vezes “muito bem” e não vem mal ao mundo, o importante é termos consciência de que o discurso pode ser muito mais enriquecedor e a reflexão muito mais interessante promovendo crianças independentes e com uma maior autoestima, e conhecimento de si e suas capacidades.

Há muitas mais formas de contornar e substituir o “muito bem” mas deixo-vos estas que são um bom ponto de partida.

Para terminar queria contar-vos uma “anedota” a propósito do elogio:

  • Estavam dois avós com o neto na praia, e cada vez que o neto colocava uma pá cheia de areia no balde, estes aplaudiam dizendo “ai que esperto é este menino” e cada vez que a criança enchia a pá de areia e colocava no balde, antes de a virar olhava para os avós e via toda a euforia, sorrindo todo contente, vendo como o que este fazia alegrava os seus avós.

Agora, troquemos esta criança, por um adolescente, estes avós pelos colegas de turma, e as ferramentas da praia por “shots”… conseguem imaginar o resultado?!

Claro que isto é exagerado, por isso me referi como anedota, mas é importante refletirmos sobre como estamos a educar as nossas crianças, que ferramentas lhes estamos a dar para serem adolescentes confiantes e seguros e adultos completos.

E sim, os anos mais importantes não são os da universidade, são os 6 primeiros anos, onde construímos as bases para o que seremos no futuro!

Até já 🙂

Joana Rebelo

 

*Carol S. Dweck / Ph.D. Social and Developmental Psychology / Mindset: The New Psychology of Success AND J Pers Soc Psychol. 1998 Jul;75(1):33-52. Praise for intelligence can undermine children’s motivation and performance.